segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

O cheque e os dissabores na compensação bancária

O cheque é um título de crédito comumente utilizado como garantia para pagamento de mercadorias e serviços. Como forma de pagamento no Brasil, o cheque é tão comum que as práticas comerciais, o dia-a-dia e o costume transformaram essa modalidade de pagamento em um pequeno financiamento direto entre o comerciante e o cliente final. O Brasil é um dos únicos países que adotam o cheque na modalidade crediário, ou seja, aceita-se o pagamento no comércio com vários cheques pós-datados, sem necessidade de passar por nenhuma financeira para aprovação. O próprio comerciante efetua a consulta do cheque nos órgãos protetivos e realiza a venda, sendo que essa prática não é comum nos países que têm o cheque como forma de pagamento somente à vista. O cheque representa ainda hoje enorme fatia nas participações de venda do varejo, apesar de nos últimos anos ter ocorrido uma queda considerável no volume de seu recebimento – seja pelo risco que representa face ao alto volume de inadimplência nessa modalidade de pagamento, seja em razão do aumento do volume de cartões de crédito e débito circulando no mercado, o que vem sendo inclusive incentivado cada vez mais pelas instituições bancárias, uma vez que sai muito mais barato para os bancos e para o próprio correntista. Apesar da eficácia desse título, é necessário que as empresas fiquem atentas ao recebimento do cheque, especialmente quando se tratar de cheques de terceiros, com quem o estabelecimento não manteve relação comercial. O emitente não se desobriga com o credor simplesmente por não manter uma relação comercial com o estabelecimento, ou seja, o fato de o consumidor estar repassando para o estabelecimento comercial um cheque que recebeu de um terceiro não desobriga o terceiro de suas obrigações para pagamento do cheque emitido. Afinal de contas, quem emitiu o cheque é responsável pelo seu pagamento. Para maior garantia no recebimento de cheques de terceiros, o comerciante pode solicitar que o cliente assine no verso do cheque na qualidade de avalista, no caso cheque ao portador, obrigando este, se houver devolução do cheque, a efetuar o pagamento. É necessário que o estabelecimento comercial colha também as informações de CPF, RG e endereço residencial deste avalista, inserindo esses dados no verso do cheque. Se o cheque estiver nominal a esse cliente, somente o endosso dele é suficiente para exigir dele o pagamento do cheque. Da mesma forma é necessário colher os dados desse cliente (endossante), lançando-os atrás do cheque juntamente com sua assinatura, que configurará o endosso, transmitindo, assim, sua titularidade. Além da consulta aos órgãos de proteção ao crédito, o empresário deve verificar as características formais do cheque, tais como alinhamento dos dados, textura, exigir carteira de identidade, CPF, cartão bancário, conferir se a foto e assinatura do cliente são as mesmas constantes no RG, as informações do CMC-7 (parte inferior do cheque) e ainda a linha louca (vide linhas desiguais no quadrado pontilhado do cheque). Os dados do CMC-7 (sistema de caracteres magnéticos codificados em sete barras) são uma segurança a mais no momento do recebimento do cheque, uma vez que esses dados se repetem na parte superior do cheque, informando: compensação, banco, agência, conta e número do cheque, dificultando assim sua falsificação. Os comerciantes devem ficar atentos ainda aos cheques popularmente chamados "clonados", prática que vem se repetindo a cada dia no comércio. Trata-se de cheque montado sobre um CPF bom, ou seja, que não tenha restrições nos órgãos de proteção ao crédito. Na prática funciona da seguinte forma: os estelionatários roubam um talão de cheques, raspam o número do CPF original constante na folha de cheque e inserem outro número de CPF sobre aquele. A única maneira de o empresário perceber que o cheque que está recebendo é clonado e evitar o seu recebimento é por meio do exame da folha de cheque na hora do seu recebimento. Nem mesmo a consulta prévia nos órgão de proteção ao crédito tem evitado os prejuízos, uma vez que são cheques montados sobre números de CPF que não têm quaisquer restrições creditícias e geralmente, ao fazer a consulta, a informação é de "nada consta", ou seja, não terá nenhuma informação que desabone aquela venda. O lojista e demais funcionários responsáveis pelos recebimentos no comércio devem se familiarizar mais e mais com esse título de crédito e sempre fazer a conferência do dígito CMC-7, lembrando que as quadrilhas de fraudadores têm se especializado cada vez mais e utilizado de meios tecnológicos mais sofisticados, no papel, na tinta utilizada para impressão ou na técnica empregada para a falsificação. A simples consulta ao SPC Brasil, Serasa e demais bancos de dados por si só não elimina o problema. O volume de cheques clonados dobrou no país nos últimos anos, cabendo ao empresariado redobrar também os cuidados para aceitação dos mesmos. O cheque clonado é devolvido pelo sistema de compensação bancária com o carimbo de alínea 35, que é o cheque fraudado, emitido sem prévio controle ou responsabilidade do estabelecimento bancário (cheque universal), ou ainda com adulteração da praça sacada, conforme Resolução 1.682, artigo 6º e Circular 2.313, artigo 4º, ambas do Banco Central do Brasil.
Manoel Ignácio Mendes Costa, Advogado, Assessor Jurídico da FCDL-MG, professor de Introdução ao Estudo do Direito da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas de Belo Horizonte (Facisa-BH), sócio do escritório MIMC & advogados

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